Sobre a lápide fria de um norte acabado, vem brilhar os raios quentes de um sol taciturno, meticulosamente cronometrado. E o símbolo cristão, posto ou infincado, pode inferir, aqui, um sinal macabro de adição umbrático.
Foto de Olício Dan.
Encontro nas letras um refúgio, nas palavras as identificações, nos sons a claridade dos meus pensamentos. Não estou sozinho, elas estão ali, paradas, encadernadas em um livro, em um texto fotocopiado, esperando o saborear das minhas miradas, a carícia morna do folhear dos meus dedos.
Entro em um mundo que aqui de
fora está estático, mas ali dentro é revolto, é ventania e tempestade. Às vezes
choro com elas, me emociono. Às vezes me dão alegria, ora reflexão. Confesso
não entendê-las todas, mas o bom é descobri-las. O bom é, em um estalo, dizer: “é
isso?”.
Não posso tentar resumir a vida,
pois não tenho o seu acabamento, seria injusto enfraquecer o resumo se ao menos
tenho a vivido, ora existido, apenas.
Existo nas manhãs que me empurram para as
obrigações civis, sinto-me mais vivo quando não tenho que me forçar a obedecer às
convenções. Nado em pensamentos tortuosos revirando nas esquinas das respostas
certas, das palavras desejadas, nas sentenças marcadas, das já estabelecidas.
Arranco espantos de ouvidos
desatentos, prescrevo um universo delirante, com pausadas palavras em um tom de
voz calmo, sorriu com elas e por elas. Animo meu corpo com uma falsa energia,
que se esgota ao dobrar a esquina. Sofro pelo medo, da noite, do escuro, da
violência.
Lembro-me em estar vazio e quando
isso acontece recorro aos poetas, aos escritores. São pessoas eternizadas pelas
palavras que me descrevem, são capazes de produzir em mim um discurso tão
familiar, descritivo e preciso. “É isso que estou sentindo, poeta!”.
Ah, se não
existissem as letras, os escritores, não haveria nada. Embora o Manoel dissesse
um dia que a poesia sem nada não é. Nada não é nada. Por isso posso dizer que
me encanta fazer nada.
A minha morada habita 4 pessoas, e
um gatinho. A porta da cozinha há uma fechadura e 3 trincos. A porta da sala é
difícil de fechar. O meu cotidiano é quente e as minhas noites veladas, por
vezes, a pensar em nadas que me plantam sementinhas a germinar logo cedo,
quando o sol aquece os muros do meu quintal.
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